Juliana
Valpasso de Andrade e Thaiz Barbosa Freitas,
História - UFF/Campos
Contexto histórico
Considerado por muitos
um político populista, Jânio Quadros era, politicamente falando, uma figura
conservadora cujos discursos agradavam bastante às classes alta e média. Nesse sentido,
em sua campanha eleitoral, que tinha como principal objetivo, segundo Posternak
(2008), o combate à ineficiência administrativa e ao desperdício, Quadros foi
amplamente apoiado pela UDN (União Democrática Nacional) e por Carlos Lacerda;
embora, de fato, não pertencesse a nenhum grande partido.
Posternak (2008) afirma
que Jânio Quadros desenvolveu uma campanha eleitoral voltada para o público
conservador, pautada na moralidade e nos “bons costumes”, atacando a corrupção;
de maneira que criou determinadas expectativas em seu eleitorado que seriam
quebradas após a posse da presidência, com a adoção da política externa
independente. O início do governo de Quadros foi marcado por uma alta taxa de
inflação, crescente dívida externa e organização administrativa corrupta.
Visando contornar a situação, Quadros promoveu políticas econômicas ortodoxas
que tinham como objetivo diminuir o déficit público e os gastos sociais e
conter a inflação.
Por outro lado, as
políticas adotadas por Jânio Quadros resultaram em cortes em diversas áreas e no
aumento dos preços de itens de primeira necessidade, como o pão e o combustível
para citar alguns. Tais políticas nacionais desconcertantes fizeram com que
Jânio Quadros passasse a ser encarado com desconfiança no meio político. Também
no cenário internacional, Quadros adotou uma política externa independente que visava
o aumento de parceiros comerciais do Brasil, sem levar em consideração a
polarização causada pela Guerra Fria, dividindo o mundo entre Estados do bloco
capitalista e Estados do bloco socialista.
Além de políticas
nacionais e internacionais, de acordo com Ribeiro (2013), o governo de Jânio
Quadros foi marcado por um forte conflito entre os poderes Executivo e
Legislativo, resultante da falta de apoio ao presidente tanto por parte da
direita quanto por parte da esquerda; tal conflito seria o ponto inicial de uma
crise política que se agravaria com a própria renúncia do presidente Quadros.
Outro grande problema enfrentado por Jânio Quadros no cenário político foi não
conseguir formar uma base governista consistente no Congresso Nacional;
problema este advindo de sua mudança de postura quando assumiu a presidência.
Se por um lado, Ribeiro
(2013) afirma que havia uma postura conservadora, na busca da manutenção da
ordem política e econômica, bem como uma estruturação nacionalista na campanha
eleitoral de Jânio Quadros; este, quando assume o poder toma posições em
discordância com os grupos conservadores, em especial no que se refere à
política externa. A aproximação do Brasil de países do bloco socialista, como
Cuba e URSS fez com que setores políticos conservadores que apoiaram Quadros em
seu período de campanha eleitoral se esvaziassem. Passou a haver, portanto,
como demonstra Ribeiro (2013), um claro embate entre a política externa
independente – não-alinhada aos Estados Unidos – e a política interna
conservadora – que buscava manter os laços com os Estados Unidos como aliado
especial; de maneira que o episódio de condecoração de Ernesto Guevara com a
Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul foi um divisor de águas nas relações
Brasil-EUA.
A tensão entre os
poderes Legislativo e Executivo chega ao auge quando Carlos Lacerda, então
governador do estado da Guanabara – aliado de Jânio Quadros à época de sua
campanha –, faz uma denúncia, via rádio, afirmando que o presidente Quadros
tinha intenções de promover um golpe de Estado. Tal denúncia acarretou o
afastamento da UDN – em função da grande influência que Lacerda tinha neste
partido – e a renúncia do presidente da república. De acordo com Ribeiro (2013),
muito embora o clima de tensão fosse claro e conhecido, o pedido de renúncia
foi, de fato, tomado com grande surpresa pelos parlamentares.
Assim como diversos
outros autores, Posternak (2008) e Ribeiro (2013) firmam que ao renunciar,
Quadros acreditava que seu pedido seria negado e ele retornaria à presidência,
com poderes ampliados. Não apenas a renúncia foi aceita, como também
representou a intensificação da crise política brasileira. Jânio Quadros foi
amplamente criticado por sua renúncia, porém nenhum parlamentar se colocou a
favor de seu retorno. Mais além, Ribeiro (2013) afirma que o poder Legislativo
teve grande influência no embate e na crise política que levaram à renúncia do
presidente Jânio Quadros.
O poder Legislativo
também influenciou largamente as tomadas de decisão posteriores à renúncia de
Quadros. O grande sentimento de surpresa causado pela renúncia gerou um impasse
institucional no que se refere à posse de João Goulart na sucessão da
presidência da república. Se por um lado o Congresso Nacional tentou de todos
os modos se manter isento da culpabilidade quanto à renúncia de Jânio Quadros, por
outro lado não poupou esforços na busca de soluções para a sucessão do cargo
que estivessem em consonância com a Constituição Federal.
A renúncia de Jânio Quadros pela Imprensa
Brasileira
Entre os dias 20 e 25 de agosto de 1961, que precedem a renúncia de
Jânio Quadros, a imprensa brasileira traz notícias cujos temas estavam quase
sempre relacionados aos conflitos políticos e a crise (gravíssima) no governo.
Nas reportagens pode-se perceber uma frequente associação entre os rumos da
política e economia do Brasil à figura de Ernesto Guevara, que visitara o país
na época, e a aproximação com Cuba e a “China Vermelha”, cujo responsável seria
o presidente Jânio Quadros, não só por implementar uma política externa com
laços cada vez maiores com o comunismo, mas por insistir em medidas que não
teriam o apoio do povo.
Com a manchete “LACERDA BRIGA
COM JQ E RENUNCIA”, o Diário Carioca,
de 20 e 21 de agosto, tem quase toda a página principal preenchida com notas
sobre a “séria crise no governo”. No canto direito, o jornal traz na integra o
pronunciamento do presidente ao líder revolucionário Ernesto Guevara e a cuba
com o título: Casa Militar não foi ver
Jânio condecorar Guevara.
Vossa excelência tem manifestado o Desejo de estreitar as relações
econômicas e culturais com o povo brasileiro. Esse é, também, nosso propósito.
Deliberação que assumi no contato que tive com o governo e com o povo cubano. O
governo e o povo brasileiro manifestam nosso apreço com esta alta condecoração”
– disse o presidente Jânio Quadros, ao conferir, ontem, na Ordem Nacional do
Cruzeiro do Sul, ao ministro
Ernesto Guevara, de cuba. (cf. Diário Carioca, 20-21/08/1961).
Ao trazer o trecho da fala do presidente e ressaltar as relações e
posicionamentos do mesmo em relação a Cuba comunista, o jornal mostra no final
da nota, outro trecho onde ressalta o descontentamento com essas medidas, por
exemplo, por parte dos militares, que não estiveram presentes na cerimônia onde
foi feito o discurso.
No dia 22 de agosto de 1961, Tribuna
da Imprensa tem como manchete: “Crise
é gravíssima: comunistas apoiam JQ”. E, seguindo a mesma linha, as notícias
sobre a crise, segundo Diário Carioca,
também no dia 22, mantém o mesmo padrão com os títulos: “JQ quer bom acordo com Fidel”; “Brasil firma acordo com China
vermelha”; “Política externa de JQ é criticada nos EUA”; “La prensa afirma que
JQ é má companhia”. Com reportagens sobre a repercussão das iniciativas do
governo de Jânio Quadros em outros países, como os Estados Unidos e Argentina,
o jornal busca reforçar suposta oposição, não só da população brasileira, mas
no cenário internacional:
Washington – O representante republicano August E. Johansen declarou,
hoje, que a recente atitude do governo do Brasil para com o regime cubano de
Fidel Castro acusa “uma dissimulação hipócrita e traiçoeira”. (cf. Diário Carioca, 22/08/1961).
O jornal La prensa ataca o presidente Frondlzl por ter se aliado ao
presidente Jânio Quadros, num editorial em que trata da posição argentina em
relação a revolução cubana. (cf. 25/08/1961).
Além das notas, o Diário Carioca
trás duas cartas de opinião: “Humilhação
e vergonha”; “Dupla traição”. Onde predominam as acusações às ações do
governo e o descontentamento por parte da população:
O apoio a uma política externa, que representa a traição do Brasil a
todas as mais autênticas tradições nacionais significa, em última instância, na
política interna, o reforçamento de uma linha de governo em que o personalismo
carismático representa o primeiro passo e o primeiro teste nas resistências da
nação a manobras, cada dia mais indisfarçáveis, no sentido de arrastá-las para
o plano inclinado das convulsões geradoras de violência, do arbítrio e do poder pessoal. (cf. Diário Carioca, 22/08/1961).
Tendência que está presente também no Tribuna da Imprensa, no dia 24 de agosto de agosto de 1961, com a
manchete: “Política externa, JQ não tem
apoio do povo”, que diz:
O povo brasileiro, em sua imensa maioria, é contra a política que
consiste em quebrar e comprometer as alianças do Brasil para lança-lo, em nome
de uma suposta “independência”, “não conformismo” ou outro eufemismo do gênero, na órbita da
Rússia. (cf. Tribuna da Imprensa, 24/08/1961).
No mesmo dia, o Diário Carioca traz
declarações de Lacerda, um dos principais ex-dirigentes do governo e personagem
de muitos dos conflitos políticos, onde se lê na Manchete: “A política externa de JQ só interessa aos comunistas”. Em notas
complementares, com os títulos “Jango
deixa a China de volta ao Brasil”; “Belgas saem do Congo e voltam ao Brasil”,
a fala do ex-ministro de Estado de Negócios econômicos da Bélgica Sr. Raymond
Scheyven aparece em destaque junto com a de Lacerda, e ressalta a incapacidade
do governo, segundo o jornal, de controlar a crise, sofrendo com críticas de
seus próprios membros:
Dizendo-se impressionado com a penetração comunista nos países
subdesenvolvidos, observou o Sr. Scheyven que só há uma maneira de evitar que
isso aconteça: a ajuda decisiva das nações ricas – acrescentou – que ocorra com
os povos da América Latina e outros países, o que ocorreu com a China. (cf.
Diário Carioca, 24/08/1961).
As
notícias sobre a renúncia de Jânio Quadros são os principais assuntos trazidos
pelos jornais no dia 26 de agosto de 1961. No dia seguinte à renúncia, e nos
que se seguem, o que predomina são reportagens que retratam a surpresa da
renúncia, por vezes tratando-a como uma atitude lamentável por parte do
presidente, e aquelas que tentam passar a ideia de ordem e calma no país,
garantida pelos militares. Além dos impactos da notícia no mundo, com destaque
para a solidariedade de Cuba, que rearfimaria as intenções da política de Jânio
Quadros. Poucos são os relatos que trazem notícias sobre as reações da
população, como o caso das manifestações que ocorreram no país.
No
geral, as notícias do dia 26, sobre a renúncia propriamente dita, apesar de
fazerem referência ao clima de surpresa e comoção, em alguns jornais são
bastante descritivas. O Diário Carioca, por
exemplo, traz os seguintes títulos: “Renúncia
de JQ é lamentável”; “Renúncia de JQ surpreendeu o país”; “Exército: situação é
calma”.
O
jornal Terra Livre, datado apenas
pelo mês, agosto, traz uma manchete que associam a renúncia do presidente à
política que “traía” a população: “Renúncia
de Jânio Quadros foi traição ao povo brasileiro”; além de outros títulos de
destaque na primeira página: “GOLPE
CONTRA GOLPE”; “RENÚNCIA E TRAIÇÃO”; “ABANDONOU O POVO”.
Vários motivos estão sendo comentados
pela imprensa do país, tentando explicar a atitude do sr. Jânio, que vinha se
conduzindo muito bem com a relação à política externa de apoio a
autodeterminação dos povos (Cuba), e aproximação com os países socialistas,
além de apoio que vinha dando à Reforma Agrária. (cf. Terra Livre, 26/08/1961).
Na verdade, a renúncia do sr. Jânio Quadros foi uma traição ao povo
que o elegeu com uma maioria esmagadora de votos. Várias atitudes do
ex-presidente, de fato, desagradaram o Governo dos Estados Unidos: o convite a
Gagárin, relações com a União Soviética, etc. Mas a última, a condecoração do
herói cubano Ernesto ‘Che’ Guevara, com a Ordem do Cruzeiro do Sul mostrando o
completo fracasso dos americanos com respeito a Cuba estourou as medidas dos
fabricantes de guerra e de miséria que governam os Estados Unidos. Criaram,
então, uma alteração entre Jânio e Lacerda, para encobrir as verdadeiras
razões, fizeram um acerto de contas com Jânio, que não deve ter saído com
prejuízo e pronto: a renúncia foi consumada, e muitos estão olhando o Jânio como
cara de herói. (cf. Terra Livre, 26/08/1961).
O que o sr. Jânio fez foi abandonar o povo numa hora angustiosa
deixando a Nação nas mãos de meia dúzia de generais que nada tem a perder com a
liquidação das liberdades, da democracia e da Constituição.
Agora, os seus Ministros Militares, num desrespeito à Constituição
Brasileira, querem impedir a posse do verdadeiro Presidente. Pois o sr. Jânio
sabia de tudo, e fez tudo de acordo com a sua conveniência, seus interesses
particulares. Se não fosse assim, ele deveria ter vindo à praça pública,
denunciaria ao povo todos os canalhas e teria o apoio deste mesmo povo que o
elegeu, alimentando grandes esperanças de uma vida livre e feliz. (cf. Terra Livre, 26/08/1961).
Na sexta página, o jornal estabelece uma relação ainda mais estreita
entre as aproximações do presidente e a política de países como Cuba, que teria
levado à fragilidade, crise, e renúncia: “Janio
apoiou a Reforma Agrária e foi obrigado a renunciar”.
A correta política externa adotada pelo governo do sr. Jânio Quadros,
de respeito a Cuba e de aproximação dos países socialistas, não vinha agradando
os grupos de traidores nacionais apoiados pelo imperialismo norte-americano.
Esta foi uma das principais razões da renúncia do sr. Jânio. Uma outra razão, é
porque as principais forças políticas da Nação estão apoiadas no latifúndio, e
o governo do sr. Jânio Quadros vinha apoiando as iniciativas que conduzem o
Brasil à
Reforma Agrária. (cf. Terra Livre, 26/08/1961).
No Última Hora essa relação
se faz ainda mais presente. Com os títulos “INTERVENÇÃO NA GB TERIA SIDO CAUSA DA RENÚNCIA” e “Jânio Foi Deposto Por Sua Política
Externa” o jornal aponta:
SÃO PAULO, 26 – (UH) – Abordado pela imprensa, quando saía, às 20,30
horas de ontem, do Palácio dos Campos Elíseos, o Sr. Herbert Levy, Presidente
nacional da UDN, declarou que dificuldades diversas e a perda da autoridade
forçaram o Sr. Jânio Quadros à renúncia. Acrescentou que esta informação fora
prestada, à tarde, pelo Ministro Castro Neves, que ouvira do Sr. Jânio Quadros. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
A explicação vem juntar-se aos rumores que corriam, à tarde, no
Palácio dos Campos Elíseos, de que o Sr. Jânio Quadros pedira intervenção
federal na Guanabara, não obtendo, entretanto, cobertura militar para a
execução da medida. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
Às 22,15 horas, subiu à tribuna, o Sr. Aurélio Viana que informou já
estar esclarecido que Jânio não renunciou ‘mas foi deposto em virtude de sua
política externa’. Adiantou, apoiado pelo Sr. José Joffillv, que essas mesmas
forças possivelmente tentarão impedir a posse de Jango que, como se sabe, no
Governo, seguiria as mesmas diretrizes externas do Presidente renunciante. (cf.
Última Hora, 26/08/1961).
Sobre as declarações da União Soviética e Cuba, citado como “Amigo número 1 de Cuba”, o jornal
reforça como as reações nesses países acusam a política de aproximação com o
comunismo que estaria sendo promovida por Jânio Quadros:
MOSCOU, 26 (UPI-UH) – A Rádio Moscou disse ontem que o presidente
brasileiro Jânio Quadros disse ao primeiro ministro russo, Nikita Krushev, que
o Brasil reiniciará
“em um futuro próximo” as relações diplomáticas com a União
Soviética. O comunicado da Rádio Moscou foi feito aqui em momento em que se
anunciava no Rio de Janeiro que Quadros havia apresentado sua renúncia como
presidente, depois de somente sete meses na primeira magistratura. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
HAVANA, 26 (FP-UH) – À renúncia do Presidente Jânio Quadros causou
sensação em Havana onde a notícia correu como um rastilho de pólvora. Até o
momento os rádios cubanos difundiram notícias sem comentários. Quadros era
considerado como o ‘amigo número um da revolução cubana’ e recentemente condecorou
em Brasília o Ministro da Indústria Ernesto Guevara. Este último disse, há 48
horas, que o Presidente do Brasil lhe reiterou ‘o mais decidido apoio a
revolução
cubana’ naquela oportunidade. (cf. Última Hora,
26/08/1961).
O
Diário de Notícias e o Jornal do Dia são um dos poucos a dar
espaço às reações populares. O primeiro, no dia 26, tem como manchete “Renúncia de JQ emociona o país” e, em
nota, na primeira página: “Intensas
manifestações tumultuaram ontem o Rio”, onde se lê:
Exigindo, aos gritos, a manutenção do regime democrático, estudantes
das Faculdades Nacional de direito, Filosofia, Direito do Catete, elementos
filiados à UNE, UME e grande número de populares, afluíram, ontem, à Assembleia
do Estado, interrompendo os trabalhos que ali se realizavam, tumultuados com a
notícia do
presidente Jânio Quadros. (cf. Diário de Notícias, 26/08/1961).
“Jânio sim! Lacerda Não!” gritavam os populares exaltados, exigindo que o Sr. Jânio Quadros
reconsidere sua decisão. Os manifestantes intitularam-se legalistas convidaram
os deputados a prestarem contas do comportamento que tomariam no plenário, em face da grave
situação. (cf. Diário de Notícias, 26/08/1961).
O
Jornal do Dia traz uma nota sobre as
manifestações: “Renúncia quase gera
tumulto na Argentina: Tanques nas ruas”. A notícia, no entanto, cita,
brevemente, as movimentações nas ruas: “Grande emoção causou hoje a notícia da
renúncia do presidente do Brasil, Jânio Quadros, tanto nas esferas oficiais do
governo como no homem das ruas” (cf. Jornal do Dia, 26/08/1961).
Com uma abordagem extremamente crítica em relação a essas
movimentações, o Última Hora destaca:
“POLÍCIA USOU DE VIOLÊNCIA PARA SUFOCAR
MANIFESTAÇÕES POPULARES”; ESTUDANTES E TRABALHADORES DO RIO EM GREVE: PROTESTO
CONTRA RENÚNCIA E DEFESA DA ORDEM”.
Pouco depois de tomar conhecimento da atitude de Jânio, renunciante à
Presidência da República, começou a tomar corpo, na Cinelândia, em movimento
popular de repúdio a Lacerda. Em frente ao busto de Vargas, na Cinelândia,
concentrou-se a massa popular. Oradores, exaltados, foram ouvidos, enquanto o
povo, em coro, passou a pedir a renúncia de Lacerda. A reação popular tomou
aspecto mais sério, quando populares, exaltados, ameaçaram iniciar uma marcha
rumo ao Palácio da Guanabara. Apesar de não se notar nenhum moimento de tropas
nas ruas, vários agentes da Divisão de Ordem Política e Social (DOPS)
infiltraram-se na multidão, prontos a entrar em ação, para reprimir o protesto
do povo. Também em frente à Assembléia Legislativa e em vários pontos da
cidade, o povo realizava manifestações a Jânio. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
Sobre as manifestações em outros países a notícia também tem como foco
o caráter “violento” das mesmas e a necessidade de controle da “ordem”: “RENÚNCIA DE JQ ABALA BEUNOS AIRES: CARROS
DE ASSALTO GANHAM AS RUAS”.
Nas ruas, em frente aos grandes jornais, se formaram grandes grupos
comentando a sensacional notícia. A chegada de novas informações mais ou menos
confusas faz aumentar a intensidade das discussões que se originam entre
partidários e adversários
do Sr. Jânio Quadros. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
Prevenindo qualquer manifestação, a polícia federal tomou diversas
medidas de segurança. Na zona central de Buenos Aires se observa a passagem de
carros de assalto. (cf. Última Hora, 26/08/1961).
Em 27 de agosto de 1961, e nos dias que se seguem, os títulos são
todos enfáticos em relação a necessidade de se pensar os primeiros passos para
resolver a crise, deixada por Jânio, manter a ordem e união nacional. O Diário Carioca dá destaque às notícias: “Congresso em vigília para resolver a
crise” e “Confiança nas forças
armadas”, que dizem:
Nesta hora grave para o regime, devemos todos considerar antes de tudo
os supremos interesses do Brasil. Acima de quaisquer sentimentos pessoais ou
partidários, o que nos cumpre neste instante é preservar a ordem, a paz e a
liberdade. É realmente enobrecedor para a democracia brasileira que tenhamos
saído, sem tumultos e sem sangue, da crise em que nos colocou, com sua ordenação
desviada das nossas tradições,
o Sr. Jânio Quadros. (cf. Diário Carioca, 27/08/1961).
O Última Hora e Tribuna da Imprensa, da mesma forma,
tentam reforçar a ideia de tranquilidade no país. No primeiro a notícia é de “Calma e Tranquilidade no Brasil Inteiro”:
Informações chegadas do País inteiro dão conta de que reina a paz em
todas as capitais e municípios. Em alguns lugares, o povo, colhido de surpresa
com a renúncia do Sr. Jânio Quadros, realizou manifestações de rua, naturais em
casos dessa envergadura – mas a ordem não chegou a ser ferida. As guarnições
militares e policiais encontram-se em regime de rigorosa prontidão, dispostas a
manter a tranquilidade, enquanto o povo, através de seus representantes
políticos, manifesta a confiança de que será preservada a legalidade com a
posse do Sr. João Goulart, conforme determina a Constituição. (cf. Última Hora, 27/08/1961).
Tribuna da Imprensa
tem como manchete: “Manter a ordem e a
liberdade”. Os títulos de destaque, até a quarta página, reforçam: “Situação normal em todo o país: polícia
tira cartazes que são subversivos”; “Hora de união nacional”; “Forças armadas
controlam todo o país: calma”, onde se lê: “A situação em todo o país é
perfeitamente normal. Cada governador domina a situação em seu Estado e
praticamente todos eles já manifestam seu apoio ao novo presidente da
república” (cf.).
No
dia 28 de agosto de 1961, a preocupação é com o futuro do país, em destaque na
manchete: “Comunismo ou democracia”:
Já chegou a hora de se escolher entre o
comunismo e a democracia no Brasil”, disse o marechal Odílio Denys, em
entrevista exclusiva. “Pessoalmente, não sou contra o vice-presidente João
Goulart. Sou contra a forma de governo que ele representa”, disse o ministro da
Guerra. (cf. Tribuna da Imprensa, 28/08/1961).
Uma preocupação que aponta, diretamente, para a possível continuidade
da política de Jânio Quadros pelo seu vice, João Goulart e os desafios que
ainda seriam enfrentados pelo governo no país.
Bibliografia
Acervo Hemeroteca Digital.
Disponível em: <http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=761672&pesq=Argentina>.
Acesso em: 2 dez. 2016.
POSTERNAK, Léo. Populismo
no Brasil de 1945 a 1964: as interpretações da Escola de Sociologia da
Universidade de São Paulo, do ISEB e do pensamento econômico liberal. 2008.
98 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Pós-Graduação em Ciências
Sociais da PUC-Rio, Pontífica Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, 2008.
RIBEIRO, David Ricardo Sousa. Da crise política ao Golpe de Estado: conflitos entre o Poder Executivo
e o Poder Legislativo durante o governo João Goulart. 2013. 231 f.
Dissertação (Mestrado em História Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.
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