Rafaela Narciso[1]
Resumo
O presente artigo procura mostrar a
visão dos países latino-americanos a respeito da atuação militar impetrada com
um golpe no país, cujo regime presidencialista não se encontrava na perfeita
ordem exigida dentro da lei da Constituição da República Federativa do Brasil.
O Brasil por sua extensão
territorial é considerado o maior país da América Latina com um vasto histórico
de lutas e resistências contra a repressão governamental.
O golpe militar no Brasil acontecido
no dia 01 de abril de 1964 teve grande destaque na imprensa latino-americana,
que com seus veículos de informação procuravam desvendar os segredos e rumores
da época.
Palavras-chave:
golpe, Brasil, jornais, América Latina;
Summary
This
article attempts to show the vision of Latin American countries regarding the
military action filed with a blow to the country, whose presidential regime was
not in perfect order required under the law of the Constitution of the
Federative Republic of Brazil.
The
Brazil for its territorial extension is considered the largest country in Latin
America with a history of vast struggles and resistance against government
repression.
The
military coup in Brazil occurred on April 01, 1964 had great prominence in the
Latin American press, which with its vehicles of information sought to unravel
the secrets and rumors of the time.
Keywords: blow, Brazil, newspapers, Latin America;
O
golpe de 1964, que gerou ampla repercussão midiática no meio popular por muitos
dias, depôs o presidente da época João Goulart. Inicialmente, o golpe teve o
apoio dos Estados Unidos através de seus agentes infiltrados nas embaixadas com
plano de intervenção política contra João Goulart, de apelido Jango, que perdeu
o apoio de uma parcela de políticos no exercício da sua função como presidente.
Os militares, insatisfeitos com a sua política, juntaram-se com os americanos
para o planejamento do golpe.
O golpe chegou ao conhecimento da
população através dos jornais, que publicaram as notícias em primeira mão. Cada
jornal do Brasil contava uma versão diferente dos acontecimentos antes e depois
do golpe, alguns chegam a ser de cunho duvidoso e intrigante.
O jornal “Correio da Manhã”[2],
que antes apoiou Jango para o cargo de Presidente da República de acordo com o
princípio da legalidade presente na constituição brasileira, manifestou o
descontentamento com o seu governo por não respeitar o que fora exigido para
sua função, ou seja, aquilo que ele próprio havia prometido cumprir o seu dever
de observar e pôr em prática as leis constitucionais para promoção de 3 pilares
fundamentais para a prosperidade do país: o bem, a união e a liberdade em prol
do povo. Este, exigiu que Jango renunciasse ao seu mandato entregando o seu
cargo para o Congresso Nacional e ao povo. E ainda ressaltou os conflitos
ocorridos dentro da Assembléia Legislativa a respeito da deposição de Jango,
uma série de discussões entre os deputados quanto à vaga da presidência. Nesse
cenário, havia uma guerra subversiva conforme afirmou Carlos Lacerda na época
como governador de Guanabara, ele próprio subestimou a força do país em
absorver uma traição e ao mesmo tempo uma liberdade. De grande destaque é a
entrada dos generais no movimento rebelde na tentativa de defender a
Constituição e pôr ordem no país através das marchas. É gritante a postura de
indignação de alguns governadores do país em especial a declaração de Ademar de
Barros, governador de São Paulo, onde os 6 estados do país se mobilizaram em
defender a constituição, dando assim o início ao movimento de oposição ao
Governo Federal, feito tudo dentro de um acordo conciliatório na luta por uma
política conservadora regada à tradição; e a acusação de Magalhães Pinto,
governador de Belo Horizonte, contra Jango em desrespeito ao princípio da
legalidade e na tentativa de estabelecer reformas próprias que não vai de
encontro com as leis constitucionais do país. O jornal dá seu desfecho com
pequenos detalhes de pouca relevância como a declaração de Juscelino
Kubitschek, que desmente o boato propagado por uma emissora de televisão em que
apóia o regime de Jango e por último, a reafirmação da greve dos trabalhadores
feita pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), por conta da prisão dos seus respectivos
líderes. No dia seguinte, destaca na primeira página a posse de Ranieri
Mazzilli para o cargo de Presidente da República feita na madrugada desse mesmo
dia por Moura Andrade, presidente do Congresso Nacional e a vitória da nação
com o afastamento de João Goulart do cargo presidencial deixando claro que não
era uma vitória da direita e sim daqueles que não toleravam o radicalismo e que
não deixavam de qualquer modo que o processo democrático fosse interrompido abruptamente
em favor da disciplina da legalidade e o cumprimento da lei. Após esse fato, o
general Artur Costa e Silva é empossado como comandante-chefe do Exército
Nacional chegando a reunir com outros militares para afirmar a promessa da
volta à legalidade. Nesse dia, a capital de Recife é tomada pelo Exército, já
em maior número de militares, obrigando o governador Miguel Arraes a renunciar
ao seu cargo, onde em seu lugar estaria o seu vice Paulo Guerra e o governador
Ademar de Barros declara extinto o CGT, levando à prisão do seu líder Osvaldo
Pacheco e os seus membros.
Outro grande jornal com enorme popularidade
entre seus leitores, a “Folha de S. Paulo”[3] que
reportou na véspera do golpe uma matéria vinculada indicando Mazzilli como
presidente da República no lugar de Jango, como declarou Auro de Moura Andrade em que o
próprio Jango havia abandonado o cargo e partido para o Rio Grande do Sul em
busca de apoio especial do seu então cunhado, o deputado Leonel Brizola. Costa
e Silva, tendo assumido o cargo de comandante-chefe do Exército Nacional,
acabou por tomar vastas medidas opressoras com objetivo de eliminar a subversão
manifestada de Leonel Brizola no Rio Grande do Sul.
No Rio de Janeiro, o popular jornal
“Tribuna da Imprensa”[4] já
impressionava pelo uso de palavras de baixo calão contra Jango, sendo apontado
como comunista, covarde e canalha. Direcionava pesadas críticas à outras
pessoas envolvidas durante o governo Jango e deixava claro a idéia de uma
possível reforma e organização do novo governo onde os militares eram vistos
como democratas, promovendo assim a dominação e a vigilância sobre as
principais regiões do país, sem deixar de mencionar as prisões efetuadas contra
políticos como Abelardo Jurema e Badger Silveira. O jornal emite um pequeno
convite às pessoas para comparecerem ao comício “Marcha da Família com Deus
pela Liberdade” promovendo a vitória dos parlamentares democratas, no caso os
militares, que comemoraram a derrubada do comunismo feita nos moldes
democráticos. Em seguida, levantam rumores relevantes que, na época,
repercutiram no meio social do país.
Outro jornal, o “Ultima Hora”[5],
em sua manchete do dia 1 de abril de 1964, aborda o deslocamento das tropas,
que sob a ordem de Magalhães Pinto, partem para Minas Gerais para conter as
rebeliões militares. Contavam também com pequenas publicações de outros
importantes jornais do exterior, o “New York Times” que previa alta inflação
fazendo beirar a economia do país à ruína com risco da perda de débitos
comerciais com as empresas européias e a impossibilidade de reforma devido à
gravidade da crise. O “Le Monde” faz uma metáfora vendo o Brasil trafegar na
estrada limpa no que diz respeito ao rumo político dando direcionamento à
esquerda. Foi noticiado em primeira página o incêndio ocorrido na própria
redação do jornal, especula-se que o responsável tenha sido um grupo de
manifestantes simpatizantes do fascismo. Os danos sofridos pelo jornal
resultaram em enorme prejuízo, que recorreu à justiça pela indenização por
danos e pela violência sofrida. Sem falar na União Nacional dos Estudantes
(UNE), que assim como o jornal sofreu um incêndio, com prejuízos incalculáveis,
causados pelos agitadores e impedindo o trabalho dos bombeiros para eliminar o
incêndio. Os próprios estudantes tentaram desesperadamente resistir a esse
ataque popular. O que era impossível acabou por se tornar surreal quando um
jornal concorrente chamado “Jornal do Brasil” lamentou e condenou o atentado
sofrido pelo jornal “Ultima Hora”[6]
defendendo o princípio da liberdade de pensamento presente na constituição do
país e lutando pelo progresso da Nação. Em seguida, leu-se o grande manifesto
composto por 3 generais: Castelo Branco, Décio Escobar e Artur Costa e Silva,
quem juntos com a Força Armada juram solenemente defender a constituição,
garantindo a lei e ordem no país.
Os países da América Latina que
tanto lutaram pela independência de forte domínio contra os países coloniais
europeus, o que atualmente carregam heranças provenientes dessa dominação
através dos seus respectivos idiomas e ideais de liberdade sob a régia dos
direitos fundamentais de uma nação livre e autônoma de qualquer repressão
política que possa vir a reprimir os seus habitantes latino-americanos.
Não só o Brasil que teve um período
difícil de ditadura militar, outros países como Argentina, Chile e Uruguai
também sofreram com a repressão militar das Forças Armadas, chegando muitas
vezes a provocar comparações entre os regimes dos 4 países. A ditadura
brasileira é vista pelos setores dominantes desses 4 países como parte de um
plano de modernização e indústria. Setores de esquerda o viam como uma grande
potência da América de forte imperialismo. É fato que algumas pessoas tinham
pouco interesse pela ditadura do seu país vizinho.[7]
Chile, que naquele ano se encontrava
em disputa eleitoral pelo cargo de presidente, via no golpe como um ato de
intervenção imperialista praticado pelos Estados Unidos, para conter as forças
comunistas. O país iria sofrer o próprio golpe 9 anos mais tarde, apoiado pelos
Estados Unidos onde Salvador Allende morre, o que acabou levando Augusto
Pinochet à presidência. Instaurou-se uma ditadura militar no Chile tendo o de
Brasil como modelo para manter a ordem e combater o comunismo, o que está claro
nos jornais através de charges mostrando como o Brasil está sofrendo
manipulação abusiva dos Estados Unidos. Isso não passa de uma interpretação de
esquerdas marxistas, na realidade não há uma melhor compreensão sobre a relação
entre Chile e Brasil. O Brasil, com Emílio Garrastazu Médici como presidente,
havia enviado espiões para apoiar as torturas contra os militantes em especial.[8]
O jornal “El Tiempo” de Colômbia
afirma que a renúncia do presidente Jânio Quadros levou a precipitar o golpe em
que os militares exerceram o seu papel pertubador sobre o país.[9]
No México, o jornal “El Universal”
aponta que João Goulart foi destituído do cargo de presidente a mando de
Humberto Castelo Branco.[10] O
popular jornal “La Cronica de Hoy”[11]
em uma reportagem afirma que o golpe de 1964 foi planejado pelos Estados Unidos
para evitar a “cubanizar” o Brasil. Segundo, o ex-embaixador dos Estados Unidos
no Brasil na época do golpe Lincoln Gordon, havia o “Plano de Contingência para
o Brasil” de enviar as armas clandestinamente dentro de um submarino para
prestar apoio aos militares. Existem certas empresas estrangeiras que são
acusadas de colaborar com a ditadura militar, a exemplo o jornal “El Sol de
México”[12]
em que a Volkswagen sofreu essa acusação por permitir que os seus funcionários
sejam torturados pelos militares.
De todos os países da América
Latina, o Brasil foi o único país a ter uma ditadura militar longa, ou seja,
durou 21 anos. No quesito de números de mortos e desaparecidos, quem se
sobressaiu foi a Argentina com estimativa de 30 mil mortos.
Atualmente, com a Lei da Anistia[13] o
Brasil pôde revirar o passado e buscar a verdade envolvendo os torturadores e
principalmente as vítimas, mas encontra dificuldades para dar prosseguimento às
investigações, as pessoas que poderiam colaborar com a investigação já morreram
e alguns militares negam contar a verdade sobre as vítimas. Há os militares que
conseguiram o perdão do governo pelos seus crimes. Fica na história do país, a
consciência e a valorização da democracia por parte da sociedade brasileira,
buscando sempre a prosperidade e o progresso para o bem-estar social.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- “Os Estados já em
rebelião contra JG”. In: Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 1 de abril de 1964.
- “Mazzilli é o novo
presidente”. In: Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 2 de abril de 1964.
- “Congresso declara presidência
vaga; Mazzilli assume”. In: Jornal Folha de São Paulo. São Paulo, 2 de abril de
1964.
- “Democratas assumem
comandos militares”. In: Tribuna da Imprensa. Rio de Janeiro, 2 de abril de
1964.
- “Sublevação em Minas
para depor Jango”. In:Jornal Ultima Hora. Rio de Janeiro, 1 de abril de 1964.
- “Jango no Rio Grande
e Mazzilli empossado”. In:Jornal Ultima Hora. Rio de Janeiro, 2 de abril de
1964.
-Disponível
em:< <http://ansabrasil.com.br/brasil/noticias/brasil/entrevistas/2014/04/01/50-anos-do-golpe-Brasil-visto-pelos-seus-vizinhos_7684243.html>>.
Acesso em :17/03/2016.
-Disponível
em: <<https://gruposalome.wordpress.com/2013/09/12/11091973-40-anos-do-golpe-militar-no-chile/>>.
Acesso em: 17/03/2016.
-“Brasil
vota hoy por la democracia”. In: Jornal El Tiempo. Bogotá (Colombia), 15 de
novembro de 1982.
-Disponível
em: <<http://archivo.eluniversal.com.mx/internacional/35028.html>>.
Acesso em: 17/03/2016.
-Disponível
em: << http://arte.folha.uol.com.br/especiais/2014/03/23/o-golpe-e-a-ditadura-militar/o-acerto-de-contas.html>>
Acesso em: 17/03/2016.
[1]
Graduanda em História pela
Universidade Federal Fluminense (UFF). E-mail: rafaelanarcisoguima@gmail.com
[2] “Os Estados já em rebelião contra
JG”. In: Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 1 de abril de 1964.
“Mazzilli
é o novo presidente”. In: Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 2 de abril de 1964.
[3] “Congresso declara presidência vaga;
Mazzilli assume”. In: Jornal Folha de São Paulo. São Paulo, 2 de abril de 1964.
[4] “Democratas assumem comandos
militares”. In: Tribuna da Imprensa. Rio de Janeiro, 2 de abril de 1964.
[5] “Sublevação em Minas para depor
Jango”. In:Jornal Ultima Hora. Rio de Janeiro, 1 de abril de 1964.
[6] “Jango no Rio Grande e Mazzilli
empossado”. In:Jornal Ultima Hora. Rio de Janeiro, 2 de abril de 1964.
[7] Disponível em:< <http://ansabrasil.com.br/brasil/noticias/brasil/entrevistas/2014/04/01/50-anos-do-golpe-Brasil-visto-pelos-seus-vizinhos_7684243.html>>. Acesso em :17/03/2016.
[8] Disponível em: <<https://gruposalome.wordpress.com/2013/09/12/11091973-40-anos-do-golpe-militar-no-chile/>>. Acesso em: 17/03/2016.
[9] “Brasil vota hoy por la
democracia”. In: Jornal El Tiempo. Bogotá (Colombia), 15 de novembro de 1982.
[10] Disponível em: <<http://archivo.eluniversal.com.mx/internacional/35028.html>>. Acesso em: 17/03/2016.
[13] Disponível em: << http://arte.folha.uol.com.br/especiais/2014/03/23/o-golpe-e-a-ditadura-militar/o-acerto-de-contas.html>> Acesso em: 17/03/2016.
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